Dentre os estilos de músicas ocidentais, do clássico ao pop,
algumas combinações de músicas são consideradas mais prazerosas que outras.
Para a maioria dos ouvidos, um intervalo de C–G (dó- com sol), que seria uma 5ª justa por
exemplo, soa muito mais agradável do que a dissonante combinação entre C e F# (dó
e fá#), que seria uma 4ª aumentada.
Por décadas, neurocientistas vêm ponderado se essa
preferência é de alguma forma gravada em nossos cérebros. Um novo estudo do MIT
e da Universidade de Brandeis sugere que a resposta é não.
Numa pesquisa com mais de 100 pessoas pertencentes a uma
remota tribo amazônica, com pouca ou nula exposição à música ocidental, os
pesquisadores relataram que intervalos dissonantes como o de C e F# (4ª#)
foram classificados tão agradáveis quanto acordes “consoantes”, que apresentam
índices simples e íntegros entre as frequências acústicas das duas notas.
“Esse estudo sugere que a preferência pela consonância à
dissonância depende da exposição para a cultura musical ocidental, e que a
preferência não é inata, ” diz Josh McDermott, um professor do Departamento de
Neurociência do MIT.
McDermott e Ricardo Godoy, um professor da Universidade de
Brandeis, coordenaram a pesquisa, que foi publicada pela Nature no dia 13 de
julho. Alan Schultz, um professor de antropologia médica na Universidade de
Baylor, e Eduardo Undurraga, um pesquisador sênior da Escola de Brandeis Heller
de Política Social e Administração, também estão no estudo.
Consonância e dissonância
Por séculos, alguns cientistas pensavam que o cérebro é
programado para responder favoravelmente à acordes consonantes como o quinto
(chamado assim porque uma de suas notas é cinco notas acima que as outras).
Músicos em sociedades pouco mais antigas que os gregos, notaram que no quinto e
outros acordes consonantes, a proporção de frequências das duas notas é
geralmente baseada em números inteiros – no caso da quinta, uma proporção de
3:2. A combinação de C e G é geralmente chamada de “quinta justa” (5ªJ).
Outros acreditam que essa preferência foi culturalmente
estabelecida, como um resultado à exposição a música com acordes consonantes.
Esse debate tem sido difícil de resolver, principalmente porque hoje em dia
existem poucas pessoas que não estão familiarizadas com a música ocidental e
seus acordes consonantes.
“É muito difícil encontrar pessoas que não têm muita
exposição à música pop devido a sua difusão ao redor do mundo, ” diz McDermott.
“A maior parte das pessoas ouvem muito à música ocidental, que têm vários
acordes consonantes. Entretanto, tem sido difícil descartar a possibilidade de
que nós gostamos de consonância porque estamos acostumados, mas também é
difícil fornecer um teste definitivo. ”
Em 2010, Godoy, um antropólogo que tem estudado uma tribo
amazônica conhecida como Tsimane por anos, pediu a colaboração de McDermott no
estudo acerca da resposta da tribo à música. A maioria dos Tsimane, uma
sociedade agrícola e de forrageamento com cerca de 12.000 pessoas, têm uma
exposição muito limitada à musica ocidental.
“Eles variam muito um quão perto vivem de cidades e centros
urbanos” disse Godoy. “Entre os mais velhos que vivem bem longe, há vários dias
de distância, eles não têm muito contado com a música ocidental. ”
A música própria dos Tsimane combina apresentações cantadas
e instrumentais, mas geralmente de uma pessoa por vez.
Grandes diferenças
Os pesquisadores fizeram dois conjuntos de estudo, um em
2011 e outro em 2015. Em cada pesquisa, eles pediram aos participantes para
avaliarem o quanto eles gostam de acordes dissonantes e consonantes. Os
pesquisadores também realizaram experimentos para ter certeza de que os participantes
podiam estabelecer a diferença entre sons dissonantes e consoantes, e eles
podiam.
A equipe realizou o mesmo teste com um grupo de bolivianos
falantes de espanhol que vivem numa cidade pequena perto dos Tsimanes, e com
residentes da capital boliviana, La Paz. Eles também testaram grupos de músicos
e de não-músicas americanos.
“O que nós descobrimos é que a preferência por consonância à
dissonância varia drasticamente entre esses cinco grupos, ” diz McDermott. “Nos
Tsimanes é indetectável, e nos dois grupos da Bolívia, há pouca preferência,
mas estatisticamente significante. Nos grupos americanos a diferencia é um
pouco maior, e é maior entre os músicos do que entre os leigos.
Quando pedidos para avaliar sons não-musicais, como risadas
e suspiros, os Tsimanes mostraram respostas similar a dos outros grupos. Eles
também mostraram o mesmo desapreço à uma qualidade musical conhecida como
rugosidade acústica.
As descobertas sugerem que a preferência por acordes
consoantes é mais cultural do que biológica, diz Brian Moore, um professor de
psicologia da Universidade de Cambridge, que não estava envolvido na pesquisa.
“No geral, os resultados deste estudo emocionante e bem
concebido sugerem claramente que a preferência por certos intervalos musicais
de quem está familiarizado com a música ocidental depende de exposição a que a
música, e não em uma preferência inata para certos índices de frequência,”
escreveu Moore em um comentário no artigo da Nature.
Publicado no MIT
Nenhum comentário:
Postar um comentário