sexta-feira, 28 de agosto de 2015

Produção Musical - Parte II - Registro e Analise



Registro Original

A música concebida precisa ser registrada de alguma forma. Tanto para fins de proteção dos direitos autorais quanto para viabilizar uma produção – poder ser revisitada, estudada, otimizada, analisada, comunicada a outros profissionais. O registro pode acontecer de várias formas, sendo que as mais comuns são: partituras, tablaturas, cifras, letras ou uma simples gravação do áudio que registra apenas letras sobre melodia, melodia sobre harmonia ou simplesmente ideias melódicas.

Em futuras reuniões com o produtor musical, o compositor ou intérprete discutirá objetivos, expectativas, cronogramas, custos, alternativas, referências e repertórios. Além de ser utilizado como ponto de partida para a pré-produção, este registro também servirá para comunicar ao produtor e sua equipe qual é a essência da música – sua mensagem, conteúdo lírico e musical. Trata-se, portanto, do primeiro registro objetivo do compositor.

Quando gravado em formato de áudio, possui uma particularidade de extrema importância – captou intenções espontâneas do artista, que são importantes e não devem ser esquecidas durante as próximas fases.

É costume revisitar o registro original durante a produção para não se distanciar do objetivo inicial.

Um produtor experiente saberá identificar quais são elementos do registro original que devem ser trabalhados e não julgará a música como uma produção final - afinal, ela só está começando. A qualidade do áudio, por exemplo, pouco importa neste momento.

A gravação original normalmente é composta de voz e violão, voz e piano ou algum instrumento de maior familiaridade para o compositor. Muitos artistas preocupam-se em gerar um registro com boa qualidade de áudio. Gravam várias versões, fazem alterações e colocam instrumentação.
Essas etapas deveriam ser deixadas para depois. Na verdade, o resultado pode até ser negativo – o registro perde a intenção original e a essência da composição, que é base para a pré-produção que se inicia agora. O registro original não deve ser confundido com a gravação-guia, que será explicada adiante.
O registro original, para todos os efeitos, é a expressão mais espontânea e sincera do compositor.

A avaliação (e a quantidade de musipontos, tratados na Parte I ) de uma composição pode ser feita através dele. Com prática, rapidamente sabemos se estamos diante de uma composição fraca, boa ou excelente.
Curiosidade: depois que a música já está produzida, como podemos avaliar uma composição isoladamente? É só cantá-la ou tocá-la no violão. Uma boa composição soará interessante, mesmo sem produção! As composições com 3 ou 4 musipontos são as primeiras candidatas a remixes e versões acústicas.

Análises

Esta fase inicia a Pré-Produção.

A Pré-Produção tem função muito clara no processo: otimizar a composição através de um ponto de vista alheio. Fazer com que a música tome forma e esteja pronta para ser produzida (gravada, mixada).

São planejados cronogramas, recursos e alternativas. A princípio, as etapas que seguem a pré-produção não deveriam voltar atrás para trabalhar, por exemplo, letras, instrumentação, forma ou estilo. Estes aspectos podem e devem ser decididos agora, na pré-produção, justamente para se evitar futuros erros e frustrações.

No papel de compositores, é fácil termos uma visão bastante particular da nossa obra. É como um filho, nós o protegemos e não queremos enxergar seus defeitos.
Já na pré-produção, é altamente recomendado que uma outra pessoa comece a acompanhar o processo produtivo, participando das decisões. 

O produtor musical normalmente começa a agregar nesta fase. Este profissional possui um distanciamento natural da composição e tende a julgar com maior clareza o possível impacto da música no público.

As análises mais comuns realizadas nesta fase são:

●Identificar qual o "estilo de produção" e concentrar-se nele durante todo o processo. Uma música pode possuir um elemento marcante e repetitivo, lírico ou musical (Hook, Riff), pode querer destacar um ritmo ou levada (Groove), possuir um forte conteúdo poético e narrar uma história (Letras), caminhar para um clímax musical (Chorus) etc.

●Estudar a complexidade da produção para se estimar custos e prazos, bem como metas factíveis.

●Escalar e contratar eventuais profissionais adicionais - técnicos e músicos.

●Analisar os elementos principais quanto à sua clareza e eficiência (ex.: título, tema, forma, início, contorno).

●Avaliar aspectos psicoacústicos da música, como equilíbrio, economia, variedade, contraste e foco.
●Planejar o equilíbrio tonal: uso do espectro sonoro (instrumentação e arranjo), congestionamento e inteligibilidade.

●Otimizar a distribuição espacial e temporal - elementos próximos e distantes, panorama horizontal, "tamanho" de cada instrumento, profundidade, intimismo, punch, naturalidade.

●Tomar decisões conscientes para que se possa seguir adiante e não voltar mais ao assunto. Saber produzir é saber quando parar. O processo pode nunca ter fim, sempre haverá possibilidades e dúvidas. Aliás, este é um dos principais motivos para se contratar um produtor.

O papel do produtor é visualizar o resultado final da música, que provavelmente só estará claro (e audível) ao término da produção, estimulando decisões que contribuam para o objetivo estabelecido. Portanto, uma relação de confiança entre os artistas e o produtor é fundamental para o sucesso das próximas etapas.

Uma ferramenta muito útil durante as análises é o uso de referências. A grande maioria das composições baseia-se em algum elemento já existente. É praticamente impossível ser 100% original.

As referências escolhidas pelo artista/intérprete (ou aquelas trazidas pelo produtor) guiam a produção e ajudam a manter o foco.
Obviamente, as referências devem ser usadas com cuidado para não caracterizarem plágio. Tratam-se de músicas (ou discos) previamente lançadas que possuem algum elemento marcante – um timbre, uma levada, um instrumento, uma maneira de se cantar, um efeito sonoro ou estilo musical.

Nem todos os produtores seguem um padrão durante as análises. Em alguns casos, justamente porque já desenvolveram a habilidade de escutar a composição visualizando o resultado final da produção. Em outros casos (diria até na maioria deles) acreditam que analisar cada um dos detalhes seria uma perda de tempo.

Minha visão é que tempo de pré-produção nunca é tempo perdido! Aproveite que o “taxímetro” do estúdio não está rodando, ainda não há pressão da gravadora (ou de quem quer que esteja financiando) e tudo ainda pode ser modificado com certa facilidade. Seguir um roteiro de análises é talvez a melhor maneira de se desenvolver o que chamo de “diagnóstico da primeira audição”.

Pode parecer estranho existirem pessoas na produção levando horas para analisar os diferentes aspectos de uma composição, enquanto que os ouvintes simplesmente escutarão a música, sem ouvidos críticos.

Esta é talvez a maior resistência de alguns produtores: “Os ouvintes não pensarão nisso, não sabem analisar esses critérios.” Ingênuo engano! O público é bastante crítico, embora não pense conscientemente durante uma avaliação.

Apreciar ou criticar é fácil – gosto, não gosto. Como consumidores, passamos anos e anos desenvolvendo nossos critérios de avaliação, através de inúmeras experiências, lembranças e referências. Querendo ou não, somos excelentes críticos! A dificuldade é criticar vestindo o chapéu de produtor, poder conscientemente criar algo que cause uma determinada reação. Como muitos dizem, com toda razão: criticar é fácil, difícil é fazer melhor. Ainda que você trabalhe com produção musical, durante a maior parte do tempo você estará escutando, não produzindo – aprendendo a julgar e não a ser julgado.

Quando faço uma avaliação no meu site, explico minha análise do ponto de vista do produtor. A “audição crítica” requer prática e foco, para que eu não me comporte como um ouvinte. No entanto, no final das contas, se avalio, por exemplo, uma música com nota 6, muito provavelmente a maioria dos ouvintes também concordará que se trata de uma produção notável, mas ainda sem potencial de virar um hit.

Fonte: Dennis Zasnicoff

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