Esqueça a
motivação, o que você precisa é disciplina
Para fazer qualquer coisa, há basicamente duas
formas de se colocar numa situação em que aquilo efetivamente vai ser feito.
A primeira opção, mais popular e devastadoramente
errônea, é tentar se “automotivar”.
A segunda, uma escolha um tanto impopular e
completamente correta, é “cultivar a disciplina”.
Trata-se de uma daquelas situações onde adotar uma
perspectiva diversa redunda em resultados superiores imediatamente. Poucos usos
do termo “mudança de paradigma” são realmente legítimos, mas aqui temos um
deles. É como acender a lâmpada em cima da cabeça.
Qual é a diferença?
A motivação, falando de modo geral,
opera sob a presunção errônea de que é necessário um estado mental ou emocional
particular para que uma tarefa seja realizada.
Isso está completamente invertido.
A disciplina, em vez disso, separa o
funcionamento externo dos sentimentos e mudanças de humor, e assim
ironicamente, ao melhorar as emoções de modo consistente, evita o
problema.
As implicações disso são enormes.
Levar as tarefas a cabo efetivamente causa os estados
interiores que procrastinadores crônicos acreditam que precisam para iniciar as
tarefas em primeiro lugar.
Colocando de forma mais simples: Não se
deve esperar até se sentir bem para começar a estudar ou praticar um
instrumento. Mas ao contrário, estuda-se e pratica-se para se sentir bem.
Quando a ação se condiciona pelas emoções, esperar
um estado de humor ideal se torna uma forma particularmente insidiosa de
procrastinação. Conheço isso muito bem, e gostaria que alguém tivesse me
apontado isso vinte, quinze ou dez anos antes de eu acabar aprendendo a
diferença ralando na vida.
Quem espera até ter vontade de fazer as coisas para
fazê-las, está ferrado! É exatamente disso que surge o temido círculo vicioso
de procrastinação.
O ciclo da procrastinação
Mais tarde eu faço! -> Droga, não tô fazendo
nada. -> Talvez eu deva considerar começar essa tarefa... -> ... mas não
estou disposto o suficiente para fazê-la bem. (repete)
A essência de correr atrás da motivação é a
insistência na fantasia infantil de que só devemos fazer as coisas que estamos
a fim de fazer. O problema então se coloca da seguinte forma: “Como eu chego ao
ponto de estar a fim de fazer o que eu racionalmente decidi
fazer?” Isso é ruim demais.
A pergunta certa seria “Como deixo meu humor de
lado e faço as coisas que conscientemente quero fazer, sem frescura?”
O ponto é cortar a ligação entre os sentimentos e
as ações, e fazer a coisa de qualquer jeito. Você vai se sentir bem, energético
e excitado depois de agir.
A motivação inverte tudo isso. Estou 100%
convencido de que esta perspectiva defeituosa é o principal motor da epidemia
de “sentar de cuecas jogando videogame...” que atualmente ataca os países
desenvolvidos.
Também há problemas psicológicos na dependência da
motivação.
A vida e o mundo reais algumas vezes exigem que se
faça coisas com que ninguém em sã consciência conseguiria se entusiasmar, e
assim a “motivação” se depara com o obstáculo insuperável de tentar produzir
entusiasmo por aquilo que objetivamente jamais o mereceria. Fora a preguiça, a
única solução é acabar com a sanidade das pessoas. Esse é um dilema horrível, e
felizmente falacioso.
Tentar martelar o entusiasmo por
atividades fundamentalmente chatas e miseráveis é literalmente uma forma de
automutilação psicológica deliberada, uma insanidade voluntária, tipo:
” - Gosto tanto desse exercício
que mal posso esperar para praticar”.
” - Gosto tanto dessa música que
mal posso esperar para estuda-la”.
Palavras positivas e pensamento
positivo não mudam ou param nem uma dor de barriga, não é isso que vai te
impulsionar.
Não considero episódios
autoinfligidos de hipomania os melhores impulsionadores da atividade humana. É
inevitável que ocorra algum tipo de compensação tímica com episódios de
depressão, uma vez que o cérebro humano não tolera o abuso por tempo
indeterminado. Estão presentes travas e válvulas de segurança. Ocorrem ressacas
hormonais.
A pior coisa que pode acontecer é ser bem sucedido
na coisa errada – temporariamente. Um cenário muito superior é reter a
sanidade, o que infelizmente tende a ser confundido com fracasso moral:
“Eu ainda não amo
meu trabalho fútil de ficar tirando musicas, devo estar fazendo algo errado.”
“Ainda prefiro
tocar Rock, e não Jazz, não entra na minha cabeça, talvez eu seja burro mesmo.”
“Eu devia comprar
outro livro sobre teoria pra me motivar.”
“Quando eu comprar
aquele pedal X, guitarra Y, e o amplificador Z, ai sim vou me sentir empenhado
a estudar...”
Besteira pura!!!! O erro crucial aqui é encarar
essas questões em termos de presença ou ausência de motivação. A resposta é a disciplina, não a motivação.
Há outro problema prático com a motivação. Tem
validade restrita, precisa ser constantemente revigorada.
A motivação é como dar corda manualmente numa
manivela pesada para através disso obter uma grande força instantânea. No
melhor dos casos, ela armazena e converte a energia para uma finalidade
particular. Há situações onde ela é a atitude correta, exceções em que ficar
superanimado e armazenar um montão de energia mental de antemão é o melhor a
fazer. Corridas olímpicas ou fugas de prisões seriam casos assim. Mas fora
esses casos limítrofes, ela é uma base terrível para o funcionamento regular
cotidiano, e para qualquer coisa que exija resultados consistentes em longo
prazo.
Em contraste a isso, a disciplina é como uma
máquina que uma vez colocada em funcionamento, na verdade passa a fornecer energia ao
sistema.
A produtividade não exige nenhum estado mental.
Para resultados consistentes em longo prazo, a disciplina supera em muito a
motivação, de fato a disciplina acaba correndo ao redor, humilhando a
motivação.
Em resumo, a motivação é tentar encontrar aquela vontade de fazer as
coisas. Disciplina é fazer mesmo se não se tem vontade. Você se sente bem
depois.
A disciplina, enfim, é um sistema que funciona, já
a motivação é semelhante aos objetivos em si. Há uma simetria. A disciplina
mais ou menos se autoperpetua e é constante, já a motivação é uma coisa meio
aos solavancos.
Como se cultiva disciplina? Construindo hábitos –
começando com coisas bem pequenas, com que se consegue lidar, comece com coisas
mínimas, e assim ganhando impulso, reinveste-se nela em mudanças cada vez
maiores na rotina, dessa forma construindo um círculo virtuoso de
retroalimentação positiva.
A motivação é uma atitude contraproducente. O que
conta é a disciplina.
Agora deixa de moleza, seu instrumento lhe espera.
#DeNada
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